terça-feira, 14 de novembro de 2023

Qual a cor da Liberdade?

 O texto poético- com um poema escrito durante o Estado Novo (a ditadura) e outro depois do 25 de abril.

Quem foi Jorge de Sena?  Um escritor (romancista, poeta, crítico, tradutor e professor universitário) que foi viver no Brasil e, depois, nos Estados Unidos, durante a década de 50 (1959), durante a ditadura, e nunca mais voltou a trabalhar e a viver em Portugal. Escreveu dois textos sobre a cor da liberdade. O primeiro é este e data de 1956:

https://ensina.rtp.pt/artigo/jorge-de-sena/

«Quem a tem»

Não hei-de morrer sem saber
qual a cor da liberdade.


Eu não posso senão ser
desta terra em que nasci.
Embora ao mundo pertença
e sempre a verdade vença,
qual será ser livre aqui,
não hei-de morrer sem saber.


Trocaram tudo em maldade,
É quase um crime viver.
Mas, embora escondam tudo
e me queiram cego e mudo,
Não hei-de morrer sem saber
Qual a cor da liberdade.

Tema:
Assunto:
Análise formal (classificação de estrofes/métrica/esquema rimático e rimas)

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2.º poema:

Às Forças Armadas e ao povo de Portugal

"Não hei-de morrer sem saber qual a cor da liberdade"
Jorge de Sena

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Quase, quase cinqüenta anos
reinaram neste país,
e conta de tantos danos,
de tantos crimes e enganos,
chegava até à raíz.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Tantos morreram sem ver
o dia do despertar!
Tantos sem poder saber
com que letras escrever,
com que palavras gritar!

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Essa paz de cemitério
toda prisão ou censura.
e o poder feito galdério,
sem limite e sem cautério,
todo embófia e sinecura.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Esses ricos sem vergonha,
esses pobres sem futuro,
essa emigração medonha,
e a tristeza uma peçonha
envenenando o ar puro.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Essas guerra de além-mar
gastando as armas e a gente,
esse morrer e matar
sem sinal de se acabar
por política demente.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Esse perder-se no mundo
o nome de Portugal,
essa amargura sem fundo,
só miséria sem segundo,
só desespero fatal.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Quase, quase cinquenta anos
durou esta eternidade,
numa sombra de gusanos
e em negócios de ciganos,
entre mentira e maldade.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Saem tanques para a rua,
sai o povo logo atrás:
estala enfim, altiva e nua,
com força que não recua,
a verdade mais veraz.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

1974


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